domingo, 29 de maio de 2011

O PADEIRO.

 
 Levanto cedo, faço minhas abluções, ponho a chaleira no fogo para fazer café e abro a porta do apartamento - mas não encontro o pão costumeiro. No mesmo instante me lembro de ter lido alguma coisa nos jornais da véspera sobre a "greve do pão dormido". De resto não é bem uma greve, é um lock-out, greve dos patrões, que suspenderam o trabalho noturno; acham que obrigando o povo a tomar seu café da manhã com pão dormido conseguirão não sei bem o que do governo.
 
Está bem. Tomo o meu café com pão dormido, que não é tão ruim assim. Enquanto tomo café vou me lembrando de um homem modesto que conheci antigamente. Quando vinha deixar o pão à porta do apartamento ele apertava a campainha, mas, para não incomodar os moradores, avisava gritando:
 
- Não é ninguém, é o padeiro!
 
Interroguei-o uma vez: como tivera a idéia de gritar aquilo?
 
"Então você não é ninguém?"
 
Ele abriu um sorriso largo. Explicou que aprendera aquilo de ouvido. Muitas vezes lhe acontecera bater a campainha de uma casa e ser atendido por uma empregada ou outra pessoa qualquer, e ouvir uma voz que vinha lá de dentro perguntando quem era; e ouvir a pessoa que o atendera dizer para dentro: "não é ninguém, não, senhora, é o padeiro". Assim ficara sabendo que não era ninguém...
 
Ele me contou isso sem mágoa nenhuma, e se despediu ainda sorrindo. Eu não quis detê-lo para explicar que estava falando com um colega, ainda que menos importante. Naquele tempo eu também, como os padeiros, fazia o trabalho noturno. Era pela madrugada que deixava a redação de jornal, quase sempre depois de uma passagem pela oficina - e muitas vezes saía já levando na mão um dos primeiros exemplares rodados, o jornal ainda quentinho da máquina, como o pão saído do forno.
 
Ah, eu era rapaz, eu era rapaz naquele tempo! E às vezes me julgava importante porque no jornal que levava para casa, além de reportagens ou notas que eu escrevera sem assinar, ia uma crônica ou artigo com o meu nome. O jornal e o pão estariam bem cedinho na porta de cada lar; e dentro do meu coração eu recebi a lição de humildade daquele homem entre todos útil e entre todos alegre; "não é ninguém, é o padeiro!"
 
E assobiava pelas escadas.
 
Rio, maio, 1956.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

PLUTÃO.

Negro, com os olhos em brasa,
Bom, fiel e brincalhão,
Era a alegria da casa
O corajoso Plutão.

Fortíssimo, ágil no salto,
Era o terror dos caminhos,
e duas vezes mais alto
Do que seu dono Carlinhos.
Jamais à casa chegara
Nem a sombra de um ladrão;
Pois fazia medo a cara
Do destemido Plutão.
Dormia durante o dia,
Mas, quando a noite chegava,
Junto à porta se estendia,
Montando guarda ficava.
Porém Carlinhos, rolando
Com ele ás tontas no chão,
Nunca saía chorando
Mordido pelo Plutão...
Plutão velava-lhe o sono,
Seguia-o quando acordado
O seu pequenino dono
Era todo o seu cuidado.
Um dia caiu doente
Carlinhos... Junto ao colchão
Vivia constantemente
Triste e abatido, o Plutão.
Vieram muitos doutores,
Em vão. Toda a casa aflita,
Era uma casa de dores,
Era uma casa maldita.
Morreu Carlinhos... A um canto,
Gania e ladrava o cão;
E tinha os olhos em pranto,
Como um homem, o Plutão.
Depois, seguiu o menino,
Segui-o calado e sério;
Quis ter o mesmo destino:
Não saiu do cemitério.
Foram um dia à procura
Dele. E, esticado no chão,
Junto de uma sepultura,
Acharam morto o Plutão.

- Olavo Bilac -

domingo, 8 de maio de 2011

MÃE.



Eu pensei nas palavras mais lindas que eu pude lembrar
E feito mágica, elas entraram no meu coração
Via a luz de uma estrela cadente brilhando no céu
Peguei a caneta e um papel
Comecei a escrever a canção.
Eu não sei quantos versos eu fiz
Quantas coisas eu deixei de falar,
O que eu sinto por dentro é tão grande
Não dá prá explicar.
Eu só sei que nós dois somos um,
E que os teus pensamentos são meus,
E que quando eu penso em você
Estou mais perto de Deus.

Quero te dizer, minha mãe (Te amo)
Você é o meu bem querer (Te amo)
Quero te dizer minha mãe
 Que eu devo tudo a você.

Ainda lembro você sem dormir
Me esperando chegar, de madrugada
Cheia de medo e de preocupação.
Do teu jeito sorrindo
Querendo talvez disfarçar
Mas quando me via voltar,
Era um alívio pro teu coração.
Eu me lembro do teu cafuné
Dos momentos de paz e de fé,
E da tua oração toda noite
Falando com Deus.
Isso tudo você me ensinou,
Essas coisas eu não esqueci,
Hoje eu tento passar pros meus filhos
O que eu aprendi.

- José Augusto -